O que acontece aos créditos em caso de divórcio
artigo da Saldo Positivo com a contribuição do nosso Coordenador Nuno Cardoso Ribeiro
“Em caso de separação cada um dos membros continua a ser responsável pelas dívidas em comum. Saiba o que acontece aos créditos no divórcio.”
por Rute Gonçalves Marques (Saldo Positivo 21 nov 2014)
O que fazer com o crédito à habitação?
No que diz respeito ao crédito à habitação, há duas opções. “A primeira delas é nada fazer, ou seja, os ex-cônjuges não partilham o imóvel e, nessa medida, mantêm-se coproprietários ou devedores”, diz o especialista. Não acontecendo desta forma, a casa será adjudicada a um dos membros do ex-casal, com respetiva transmissão de crédito. Segundo o advogado, nos dias que correm esta situação nem sempre é possível, porque, aos olhos dos bancos, nenhum dos cônjuges tem capacidades económicas para sustentar sozinho a prestação mensal.
Caso a instituição bancária aceite a transferência de crédito, a Lei protege o cliente, uma vez que não permite que efetuem alterações nas condições do crédito, nomeadamente no spread aplicado, desde que a taxa de esforço do agregado familiar do novo titular seja inferior a 55% ou, no caso de existirem dois ou mais dependentes, a 60%.
O que são as tornas?
Quando o banco aceita a transmissão de crédito, o cônjuge que fica com a casa terá de comprar a parte do outro. São as chamadas tornas – que visam compensar quem fica sem a casa.
O montante das tornas é definido por acordo entre as partes. Para calcular este valor, tudo entra em equação: faz-se as contas ao ativo (imóvel) e ao passivo (dívida). Se houver saldo positivo, divide-se esse valor por dois e quem fica com a casa terá de dar, no mínimo, esse montante ao outro. “Na minha perspetiva, faz sentido que o eventual benefício seja partilhado. Por exemplo, se o cônjuge a quem é depositado o imóvel tem um benefício de 100 mil euros, porque a casa vale 200 mil euros e ainda faltam pagar 100 mil euros, faz sentido que o outro receba 50 mil euros”, explica o advogado. Segundo o mesmo, os juros do crédito não devem ser considerados benefícios, uma vez que não revertem para quem fica com a casa, mas sim para o banco. “Mas já vi de tudo – pessoas que pagaram ao ex-cônjuge metade de tudo o que pagaram ao banco, incluindo juros”, prossegue.
O que acontece se for crédito ao consumo?
Se o crédito em questão for de consumo (cartão de crédito, automóvel ou pessoal), ambos os cônjuges continuam obrigados a pagá-lo. “No entanto, é possível que esse crédito também seja partilhado, ou seja, que seja adjudicado a um deles”, explica o advogado. Esta divisão do crédito carece de consentimento dos bancos. “Estes aceitam se quiserem e se acharem que a pessoa a quem será adjudicado o crédito tem condições de pagar”, como explica Nuno Cardoso Ribeiro.
Neste caso não existe legislação que proteja o consumidor: “Na generalidade dos casos, esta adjudicação do crédito passa pelo fim do crédito antigo e a consignação de um novo empréstimo. Este será feito nas condições atuais, que tipicamente são menos vantajosas para o cliente”, remata o especialista. Na prática isto significa que muito provavelmente o spread do crédito irá subir, logo o montante de juros a pagar será superior.
E se houver dívidas que o outro não saiba?
Se o empréstimo em questão tiver sido contraído pelos dois, ambos ficam obrigados a pagá-lo. Porém, se o crédito apenas tiver sido feito por um dos membros do casal, a dívida só será comum se tiver sido contraída em proveito comum. Por exemplo: Imaginado que um dos cônjuges pediu um crédito pessoal para comprar móveis para a casa, a dívida beneficia a família, logo pode ser considerado bem comum.
Cabe ao banco provar que o crédito foi contraído para proveito do agregado familiar, uma vez que não existe presunção de bem comum. “Uma entidade bancária que tenha contraído um crédito apenas com um dos cônjuges, se quiser imputar a dívida a outro cônjuge terá judicialmente de demonstrar que foi adquirida para proveito comum do casal. Não se presume e não há automatismo neste processo”. Para evitar esta situação, a maior parte dos bancos pede que sejam ambos os cônjuges subscrevam os contratos.