Será que o ex-cônjuge poderá reagir a este novo uso que é dado à casa de sua propriedade?
A resposta não é automática, até porque a nossa lei não faz expressa alusão a esta possibilidade.
Ora, sabendo-se que a decisão de atribuição da casa de morada de família à ex-mulher se baseou na (maior) necessidade que lhe foi reconhecida, e que tal decisão só será alterada se se alterarem também os pressupostos originais, a verdade é que a existência de um novo companheiro poderá não representar uma situação financeira mais desafogada para esta mulher. Pelo contrário, este novo companheiro poderá até representar um encargo adicional a suportar…
Em teoria, pois, poderia entender-se que a circunstância de um terceiro – o novo namorado do ex-cônjuge – passar a residir na casa de morada de família só motivaria uma alteração da decisão de atribuição da casa se isso representasse uma melhoria na situação financeira da ex-mulher (do nosso exemplo).
Não pensamos assim. Estamos em crer – subscrevendo integralmente a posição do Supremo espanhol – que a circunstância de um terceiro passar a residir no imóvel – quer esse terceiro represente um rendimento acrescido ou não – poderá sempre motivar uma revisão da decisão original de atribuição da casa de morada de família.
Com efeito, o instituto da casa de morada de família, e a proteção legal que lhe é conferida, representam uma grave limitação ao direito de propriedade nos casos em que está em causa um bem próprio do outro cônjuge ou um bem comum. Ora, por ser assim, e sabendo-se que o direito de propriedade beneficia de proteção constitucional, as limitações somente poderão existir no caso de confronto com interesses superiores, como o são o superior interesse da criança ou a proteção de um ex-cônjuge em situação financeira débil. Se, porém, esse membro do ex-casal constitui uma nova família com um terceiro, deixa de ser exigível ao seu ex-cônjuge suportar a limitação ao seu direito de propriedade que representa ela ter sido atribuída ao seu ex-marido ou ex-mulher
Nestes casos, pois, entendemos que a decisão de atribuição da casa de morada de família poderá ser revista sempre que o membro do ex-casal passar a residir maritalmente com um terceiro. E isto porquanto entendemos, à semelhança do que faz o Supremo Tribunal espanhol, que o imóvel deixou de poder ser (legalmente) considerado casa de morada de família para efeito de ser atribuído a um ou a outro dos membros do casal.