Heranças e Partilhas

Repúdio e renúncia à herança

No momento em que é chamado a receber a herança (também designado vocação), o herdeiro (ou sucessível) adquire o direito de a aceitar ou repudiar, dependendo a transmissão da herança da sua aceitação.

O que é o repúdio da herança?

O repúdio da herança é o ato através do qual um herdeiro rejeita o convite a receber bens hereditários. É, portanto, um ato contrário à aceitação, ato pelo qual o sucessível aceita o convite a herdar.

A aceitação e o repúdio são atos cuja eficácia depende apenas da declaração de vontade do sucessível, sendo independentes da vontade do autor da sucessão (o falecido).

Através do repúdio, o sucessível renuncia definitivamente ao seu direito a herdar aqueles bens, sendo este (assim como a aceitação) um ato irrevogável. Porém, se o sucessível o praticar sob coação, ou por erro dolosamente causado por terceiro, é possível requerer a sua anulação judicial.

O repúdio é ainda indivisível, não podendo a herança ser aceite ou repudiada apenas em parte. Porém, se o sucessível for chamado à sucessão simultaneamente por lei e por testamento, pode aceitar a herança por um dos títulos e repudiá-la pelo outro, em determinadas condições.

Também não é possível sujeitar o repúdio a uma condição. Por exemplo, não é possível alguém declarar que repudia se as dívidas forem de valor superior aos bens.

Porquê repudiar?

 Existem diversos motivos que podem levar ao repúdio de uma herança. Desde logo, pode estar em causa a vontade pessoal de não receber bens de certa pessoa, ou o desejo de evitar conflitos familiares, ou mesmo a falta de interesse nos bens deixados, considerando o seu escasso valor ou o significativo montante das dívidas do falecido.

Note-se, todavia, que as dívidas da herança nunca podem afetar o património pessoal do herdeiro: mesmo que o seu valor seja superior ao valor dos bens a herdar, apenas estes podem responder pelas dívidas da herança, até ao seu limite. Porém, e a fim de evitar as burocracias e “chatices” inerentes ao pagamento das dívidas, muitas pessoas optam, nestes casos, pelo repúdio da herança.

Quem pode repudiar a herança?

Qualquer pessoa chamada a herdar terá também a faculdade de repudiar, sem que tenha de apresentar motivo justificativo e sem que seja necessária a aceitação dos demais herdeiros. Tal não significa, porém, que o repúdio seja livre em toda e qualquer circunstância.

Assim, se o potencial herdeiro for casado, o repúdio exigirá a autorização do outro cônjuge, a menos que vigore no casamento o regime da separação de bens (cf. art. 1683.º do Código Civil).

Ademais, se o sucessível for uma criança ou jovem com menos de 18 anos, os pais, como seus representantes, não poderão repudiar a menos que sejam judicialmente autorizados para o efeito (neste sentido, depende igualmente de autorização judicial a aceitação da herança ou legado sujeitos a encargos, cf. als. j) e l) do art. 1889.º do Código Civil).

Quando é possível repudiar?

O repúdio apenas pode ser efetuado após a abertura da sucessão, isto é, do falecimento do autor da herança.

Ao contrário do direito de aceitação, o qual pode ser exercido por um prazo de 10 anos, não se estabelece um prazo legal de caducidade do direito de repúdio. Porém, sendo a aceitação e a caducidade faculdades alternativas, tal significa que, se o herdeiro não aceitar a herança ao fim de 10 anos, tudo se passará como se a tivesse repudiado. Para que tal ocorra, não pode porém o repudiante estar na posse dos bens da herança nesse período, na medida em que tal comportamento pode ser tomado como aceitação tácita da herança.

Para evitar a incerteza adveniente do decurso do prazo de caducidade do direito de aceitação, qualquer herdeiro pode recorrer ao tribunal para que este notifique os sucessíveis para se pronunciarem, presumindo-se que aceitam a herança caso nada digam (artigo 2049.º do CC).

Falecendo o sucessível antes de ter exercido o direito à aceitação ou ao repúdio e antes de decorrido o prazo legal para a aceitação, o direito a suceder transmite-se aos seus herdeiros, juntamento com os restantes bens da herança. Como tal, estes, aceitando a herança do sucessível, terão então a faculdade de aceitar ou repudiar a herança de que este era herdeiro.

Como repudiar uma herança?

Para repudiar uma herança é necessário que o sucessível manifeste vontade nesse sentido por documento escrito. As exigências de formalidade desse documento, por sua vez, dependerão do tipo de bens que compõem a herança:

  1. Se a massa sucessória integrar bens imóveis, o repúdio deverá ser efetuado por escritura pública ou documento particular autenticado. Será como tal necessário recorrer a Notário ou Advogado para o efeito.
  2. Na eventualidade de estarem em causa apenas bens móveis, o repúdio pode tomar a forma de documento particular.

Nos casos em que seja necessário, o consentimento do cônjuge do repudiante haverá que revestir a mesma forma exigida para o repúdio, podendo inclusivamente constar do mesmo documento.

Caso o sucessível seja chamado à herança por testamento e na qualidade de herdeiro legitimário em simultâneo, haverá igualmente de especificar se pretende repudiá-la apenas quanto à quota disponível ou como um todo; de outra forma, presumir-se-á que a repudia por ambos os títulos.

Quais são os efeitos do repúdio?

O repúdio tem efeitos retroativos, tudo se passando como se o sucessível nunca tivesse sido chamado a herdar. Em consequência, deveria ser chamado a herdar o sucessível da classe imediatamente seguinte à do repudiante, ocupando a última classe o próprio Estado. Porém, devido ao chamado direito de representação, mediante o repúdio, os descendentes do repudiante são chamados à herança[1], tendo prioridade sobre o sucessível que se lhe seguiria.

Como o repúdio implica o afastamento dos bens sucessórios que, caso a herança viesse a ser aceite, viriam a integrar o património do sucessível, este afeta os credores do repudiante, que deixam de poder contar com os bens da herança para satisfazer a sua dívida. A fim de salvaguardar a sua posição, a lei consagra-lhes a faculdade de aceitar a herança em seu nome, no prazo de seis meses, contados do conhecimento do repúdio pelos credores.

[1] Exceto nos casos de herança adveniente de testamento, em que a representação tenha sido expressamente afastada por vontade do de cuius.

Qual é a diferença entre repúdio da herança e renúncia à condição de herdeiro?

A renúncia à condição de herdeiro é um acordo constante de convenção antenupcial, celebrado entre dois nubentes antes da celebração do casamento. Por via desta cláusula, ambos renunciam à condição de herdeiro legitimário do outro, a qual, de outra forma, seria adquirida pelo casamento.

Daqui já se vê que a renúncia e o repúdio diferem quanto à pessoa que os pode praticar, podendo a primeira ser praticada apenas pelo nubente, e a segunda por qualquer sucessível chamado a herdar, e quanto ao momento da realização do ato, sendo a primeira praticada em vida, antes da celebração do casamento, e a segunda após a morte do autor da herança, uma vez aberta a sucessão. Mas estas não são as únicas diferenças.

A renúncia e o repúdio diferem também em âmbito: enquanto o repúdio implica a rejeição da herança legal, como um todo, a renúncia apenas implica a rejeição da herança legitimária, ou seja, da quota indisponível, podendo, em princípio, o cônjuge suceder, na falta de testamento, como herdeiro legítimo. Ademais, nessa mesma convenção antenupcial e não obstante a renúncia recíproca à condição de herdeiro legitimário, os cônjuges podem instituir-se um ao outro como herdeiros ou legatários, por conta da sua quota disponível.

A renúncia também pode ser sujeita a condição, nomeadamente a sobrevivência de outros sucessíveis, ao contrário do repúdio que, como foi dito, não pode ser sujeito a qualquer condição.

Por fim, enquanto o repúdio apenas resulta na extinção do direito a suceder, a renúncia à condição de herdeiro constitui o cônjuge sobrevivo renunciante na titularidade de direito real de habitação da casa de morada de família da propriedade do falecido, e uso do respetivo recheio.

E no caso de repúdio da herança por parte de menores de idade?

Como se referiu, os representantes legais ou tutores não podem livremente repudiar a herança do sucessível menor de idade. Para o efeito, será necessário obter autorização judicial.

A competência exclusiva para a decisão pertence ao Ministério Público e é obtida mediante a instauração de processo próprio, regulado no art. 3.º do Decreto-Lei n.º 272/2001, de 13 de outubro, relativo a Processos da Competência do Ministério Público e das Conservatórias do Registo Civil.

Como saber se há repúdio de uma herança?

Caso pretenda saber se existe um repúdio de herança, poderá requerer online certidão correspondente, através do Instituto dos Registos e Notariado.

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